O otimismo em relação aos mercados emergentes e a desaceleração econômica nos Estados Unidos estão impulsionando o Ibovespa para cima — mas até quando essa tendência vai se manter?
Quem diria, Ibovespa… O índice subiu mais de 16,4% neste ano e bateu quatro recordes históricos em poucos dias — enquanto as grandes bolsas de Nova York ficaram para trás em termos de valorização.
Parece que o sonho dos mercados emergentes está se concretizando. Mas a grande pergunta é: estamos diante de uma euforia passageira ou a estabilidade vai se manter?
Para esclarecer isso, o Seu Dinheiro entrevistou André Leite, CIO da TAG Investimentos; Bruno Henriques, analista sênior de ações do BTG Pactual; Roberto Chagas, head de renda variável do Santander Asset Management; e Matheus Amaral, especialista em renda variável no Inter.
E a conclusão, segundo (quase) todos eles, é que o cenário continua otimista. Portanto, os 140 mil pontos podem ser apenas o início.
Estão deixando a gente sonhar: o que está por trás dos recordes do Ibovespa?
Até o novo recorde registrado na última terça-feira (20), o principal índice da bolsa brasileira acumulava uma alta de 3,73% em maio, atingindo 140.109,63 pontos. Nos últimos 30 dias, a valorização ultrapassa os 8%.
No entanto, segundo Roberto Chagas, do Santander Asset Management, que administra mais de R$ 374 bilhões, pouco disso é atribuído ao Brasil.
Segundo ele, o principal fator por trás desse movimento é o fluxo de investimentos deixando os Estados Unidos em direção a mercados emergentes.
Roberto Chagas explica que, após o que ficou conhecido como o Dia da Libertação — quando Donald Trump deu início à guerra comercial —, o risco de uma desaceleração acentuada da economia americana levou os investidores a perceberem que estavam excessivamente expostos às bolsas de Nova York, especialmente em ações de tecnologia.
Embora esse receio sobre a economia dos EUA tenha diminuído, principalmente após uma trégua com a China, ainda se espera uma desaceleração, mesmo que estejamos longe do famoso “fim do excepcionalismo americano”.
“As posições nas bolsas americanas estavam muito acima da média. A cada US$ 100 investidos, cerca de US$ 70 estavam lá. Costumo comparar isso a uma banheira: as bolsas dos EUA eram como um ralo gigante, sugando dinheiro de todos os lados. Agora, esse ralo está menos potente”, afirma Chagas.
André Leite, CIO da TAG Investimentos, concorda com essa análise, mas ressalta que o capital estrangeiro investido no Brasil é apenas “uma migalha” em comparação ao montante que ainda permanece nos Estados Unidos.
“Os investidores estão diminuindo um pouco suas posições por lá. Com o valor total do mercado das bolsas globais em torno de US$ 125 trilhões, cada 1% retirado dos EUA representa cerca de US$ 1 trilhão sendo redistribuído pelo mundo. O Brasil recebeu apenas uma fração disso”, explica Leite.
É importante destacar que, até 15 de maio, a B3 registrou 18 dias consecutivos de fluxo positivo de capital estrangeiro. Desde 17 de abril, mais de R$ 20,8 bilhões foram injetados no mercado. No acumulado do ano, levando em conta entradas e saídas, o fluxo estrangeiro para o Ibovespa totaliza R$ 15 bilhões — o melhor resultado para esse período desde 2023.
Além disso, a bolsa tem se beneficiado das expectativas em torno do fim do ciclo de aumento das taxas de juros. As recentes indicações do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central sobre a possibilidade de manutenção das taxas vêm reforçando esse otimismo entre os investidores.
No entanto, André Leite adverte: “Os fundamentos do Brasil não melhoraram; na verdade, pioraram. A situação fiscal está se deteriorando com Lula buscando desesperadamente a reeleição. Tivemos uma temporada de resultados razoável com algumas surpresas positivas, mas os juros altos continuam impactando negativamente essas empresas.”
Até onde o Ibovespa pode chegar?
Matheus Amaral, do Inter, acredita que os 140 mil pontos recentemente atingidos podem ser apenas o início de um ciclo promissor. Ele observa que, apesar da recente valorização, a avaliação da bolsa continua baixa, com o índice sendo negociado a cerca de 4,5 vezes o lucro, um patamar inferior à média histórica de aproximadamente 8 vezes. Isso sugere que o mercado ainda apresenta oportunidades de compra, tornando factível a possibilidade de que o Ibovespa chegue aos 150 mil pontos em um futuro próximo.
Bruno Henriques, do BTG Pactual, também adota uma perspectiva otimista em relação ao principal índice da B3. Ele destaca a qualidade das empresas que compõem o índice e os preços atrativos atuais. Além disso, Henriques aponta que muitos investidores brasileiros estão com uma alocação menor do que poderiam em renda variável, o que abre espaço para um aumento significativo de recursos no mercado acionário.
Por outro lado, André Leite, da TAG, apresenta uma visão mais cautelosa. Embora reconheça a possibilidade do índice alcançar os 150 mil pontos, ele considera essa valorização como algo temporário. Leite ressalta que, apesar das altas recentes do Ibovespa, seu desempenho ao longo do tempo costuma ficar abaixo do CDI e é marcado por alta volatilidade. Ele descreve o Ibovespa como um “ativo do futuro que nunca chega”, enfatizando que sem melhorias na economia brasileira, o potencial do mercado acionário permanecerá limitado, mesmo com ações apresentando preços atrativos e um prêmio de risco considerável.
O que pode “acabar com a farra” do Ibovespa?
De acordo com os especialistas entrevistados para esta matéria, há dois riscos significativos que podem impactar negativamente o Ibovespa. O primeiro é a possibilidade de os juros permanecerem elevados por um período mais longo do que o antecipado pelo mercado.
“Ter uma visão otimista sobre cortes nas taxas de juros no Brasil é, para mim, uma grande incerteza. No Santander, nossa expectativa é de que as taxas permaneçam altas por mais tempo do que se imagina. Acreditamos que elas ficarão em 14,75% até o final do ano”, afirma Chagas.
O segundo risco diz respeito à chance de uma nova recessão entrar em pauta, especialmente se o acordo entre China e Estados Unidos não se mantiver após os 90 dias estipulados entre as duas potências.
Além disso, embora não seja o foco principal no momento, a situação fiscal do Brasil também merece atenção. Esse tema tem sido um pouco negligenciado desde o retorno de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos. Com as eleições se aproximando, qualquer “liberação de gastos” por parte do governo Lula pode trazer consequências negativas significativas para o país.
Quais setores podem se beneficiar daqui para a frente?
Uma opinião comum entre os especialistas entrevistados é que o setor de utilities se destaca por sua resiliência, servindo como uma proteção valiosa para os investidores.
Nesse contexto, André Leite menciona as ações da Sabesp (SBSP3), destacando que a expectativa é de que a empresa dobre seu tamanho até 2030, impulsionada por uma nova gestão que está implementando melhorias significativas em eficiência operacional. “Por isso, apreciamos o setor como um todo e, dentro dele, temos uma preferência especial por essa companhia”, comenta.
Ele também menciona a Cemig (CMIG4), que se beneficia do potencial de privatização.
Matheus Amaral ressalta ainda o setor da construção civil voltado para a baixa renda, especialmente com a exposição ao programa Minha Casa Minha Vida. Segundo ele, as ações desse segmento têm apresentado um desempenho robusto na bolsa e essa tendência deve continuar.
Henriques acrescenta que o setor de consumo e varejo também merece atenção. “Em um cenário mais otimista, esse setor deverá atrair mais investimentos. Atualmente, ele pode ser considerado subavaliado, com uma valorização abaixo do que se esperava”, afirma.

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