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De IPO bilionário a saída discreta, Carrefour (CRFB3) deixa B3 com valor de mercado 44% menor

O Carrefour Brasil (CRFB3) se despediu da Bolsa brasileira na sexta-feira (30), após uma trajetória de oito anos repleta de desafios operacionais, expectativas não atendidas e uma queda superior a 40% em seu valor de mercado. A decisão foi tomada pela matriz francesa, que já possuía 70% das ações e agora adquiriu a parte restante para simplificar sua operação e acelerar a tomada de decisões estratégicas.

A entrada do grupo no mercado de capitais brasileiro, em 2017, causou um grande impacto. Com uma oferta pública inicial (IPO) de R$ 5,125 bilhões – a maior desde 2013 –, o Carrefour chegou com planos ambiciosos voltados para a digitalização e consolidação. A força do Atacadão, seu segmento de atacarejo, era vista como um grande diferencial e ajudava a consolidar a imagem da empresa como uma nova protagonista no varejo alimentar.

Nesse contexto, Eduardo Terra, fundador da consultoria BTR Retail, destaca que, especialmente após a aquisição do Atacadão, a operação brasileira se tornou extremamente relevante em termos de tamanho, crescimento e geração de negócios para a matriz francesa.

“A abertura de capital ocorreu exatamente para financiar essa expansão na época, tanto do modelo Atacadão quanto da digitalização, que já foi realizada. O objetivo inicial da abertura de capital foi alcançado”, observa.

As ações do Carrefour foram lançadas na B3 a R$ 15 e, em abril de 2022, atingiram um pico histórico de R$ 23,17. Esse aumento refletia um contexto favorável para o setor de atacarejo, impulsionado pela alta da inflação e pela perda do poder de compra, que fez com que muitos consumidores optassem por opções de compra mais acessíveis.

No entanto, esse otimismo foi passageiro. Apesar do discurso da matriz enfatizando eficiência e agilidade, o desempenho insatisfatório das ações já havia colocado o Carrefour fora da mira dos investidores. A empresa deixou a B3 com um valor de mercado de R$ 17,8 bilhões, enquanto suas ações estavam cotadas a R$ 8,48 no fechamento de ontem (30), representando uma queda de 44% em relação ao preço da oferta inicial.

Obstáculos

A queda das ações na Bolsa foi impulsionada por uma série de fatores operacionais e estratégicos. A compra do Grupo BIG (anteriormente conhecido como Walmart Brasil), anunciada em 2021 por R$ 7,5 bilhões, gerou um entusiasmo inicial no mercado. No entanto, a integração das operações revelou-se demorada, cara e complicada.

A empresa previa finalizar o processo de integração em aproximadamente 18 meses, mas encontrou desafios significativos ao converter 129 lojas de grande porte e ao fechar ou vender outras 123 unidades que se mostraram inviáveis estruturalmente.

Esse esforço demandou tempo e recursos, impactando diretamente os resultados financeiros: no primeiro trimestre de 2023, o Carrefour Brasil registrou seu primeiro prejuízo desde o IPO, totalizando R$ 375 milhões, e sua margem Ebitda caiu de 4,4% para 2,1%.

Naquele período, a analista da XP Investimentos, Danniela Eiger, destacou que os resultados refletiam a pressão sobre a rentabilidade devido às dificuldades nas conversões e aos legados do Grupo BIG, além do aumento das despesas financeiras em função do endividamento da empresa com a elevação das taxas de juros.

Consequentemente, as margens do Carrefour foram reduzidas sucessivamente em meio ao aumento da inflação dos alimentos e à intensificação da concorrência. O Assaí, que se desmembrou do Grupo Pão de Açúcar (GPA), acelerava sua expansão enquanto o GPA começava a se reposicionar no mercado premium. Foi nesse cenário que, a partir de meados de 2022, os resultados do Carrefour Brasil começaram a decepcionar e suas ações passaram a cair.

A companhia parecia “estagnada”, com uma operação sólida, mas com dificuldades para se adaptar à velocidade dos concorrentes. Para a equipe de analistas do JPMorgan liderada por Joseph Giordano, a empresa acumulou “falhas operacionais” ao longo dos anos e entrou em um ciclo de “visibilidade comprometida” durante a integração do BIG.

No final de 2024, o Carrefour enfrentou uma nova crise quando Alexandre Bompard, presidente global do Grupo, anunciou que não compraria mais proteínas provenientes do Mercosul alegando não conformidade com as normas sanitárias francesas. Isso levou os frigoríficos brasileiros a boicotar o fornecimento de carnes para as unidades da rede em todo o país. A situação exigiu até mesmo uma reunião entre o embaixador da França no Brasil, Emmanuel Lenain, e autoridades do Ministério da Agricultura para discutir o problema.

O secretário de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura, Luis Rua, comentou que a crise entre a indústria de carnes e o Carrefour refletia mais na imagem do agronegócio brasileiro do que em impactos comerciais diretos. No final das contas, Bompard recuou e enviou uma carta ao ministro Carlos Fávaro reafirmando que a carne brasileira atende às normas sanitárias exigidas pela França.


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